sábado, 29 de janeiro de 2011

Ímola, 1994

Esta noite sou eu e minhas palavras. Pois eu as tenho, sempre as tive, em meu favor, como minha certeza, meu comunicado.

Sempre me vali dos meus sujeitos. Dos meus verbos, dos meus objetos, diretos ou indiretos; sempre tive a poesia escondida em cada canto do meu quarto, do meu ser. Minhas histórias reais, minhas ilusões gostosas sobre histórias infantis, minhas próprias versões do bem e do mau, minhas próprias 1001 histórias para contar, a cada noite, uma história diferente, as 1001 maneiras de uma mesma história.

Mas, se existe uma teoria que justifica as conseqüências de todas as ações, também as palavras deveriam possuir sua própria Teoria do Caos.

*

‘’ - E a minha coragem?

- Meu bom leão, você já tem coragem de sobra. Basta ter confiança em si mesmo. O medo faz parte da vida de quem teme o perigo.’’

(O Mágico de Oz)

*

Nunca fui o tipo de pessoa que se pode julgar corajosa. Eu admito minha covardia; desde insetos até violência e solidão, passando por medinhos menores e despropositados, admito, com toda a cara-de-pau do mundo, a minha pequena (ou nem tão pequena assim) parcela de covardia.

Meu medo é relativo; costumo morrer de medo das situações antes que aconteçam, mas uma vez frente a elas, e certa daquilo que deve ser feito e do que desejo fazer, costumo virar uma leoa, não covarde, mas feroz, cheia de garra e de uma força e vontade intensas e explosivas.

Existe o medo do desconhecido, criando em nossas mentes uma série de hipóteses tão assustadoras como maravilhosas, pequenas cenas dramáticas, vislumbres de um futuro ainda não formulado. Seria este futuro divino ou catastrófico? 50% de chance, 100% de expectativa.

Existe o medo do ‘’não’’. E não se enganem, existe pois, também, o medo do ‘’sim’’. Palavras pequenas estas, certeiras. Pedrinhas minúsculas contra a vidraça da nossa janela.

Existe o medo do próprio medo. Medo de não corresponder, não dar conta, medo de amarelar. Medo de ter medo, e de demonstrar.

E existem as coragens;

Coragem de conhecer aquilo que não se conhece, ainda que para isso precisemos de certa preparação psicológica e uma dose de uísque.

Coragem de falar o que pensamos, e de ouvir o que devemos; sem meias-palavras ou longas e tenebrosas explicações.

Coragem de ir até o perigo com as pernas trêmulas e as mãos suadas, coragem de procurar as formas mais inusitadas de vencer os obstáculos; a coragem de admitir que estamos com medo.

E a coragem de ir lá dar a cara a tapa pro medo: chamar o medo pra brincar no seu quintal, incentivá-lo a ser o pegador no jogo de pique-esconde. Enquanto o medo conta, você nem pensa mais em um bom esconderijo; deixa o pé aparecendo por baixo da cortina; você deseja enfrentá-lo, deseja poder inverter as posições. Na próxima rodada, você irá procurar por ele.

Assim como o Leão Covarde, já quis ser corajosa.

Afinal descobri que a coragem também é relativa, uma relatividade dependente de fatores diversos, das histórias, do tempo, das circunstâncias, e principalmente, da confiança que temos em nós mesmos.

Da confiança que temos naqueles que porventura nos acompanharão nem é preciso comentar nada; é primordial. Faz a gente abrir a mente e o coração pras coragens do outro, tornando-as pouco a pouco um tanto mais nossas. E quem disse que não temos nenhuma coragem dentro de nosso coraçãozinho medroso para apaziguar os medos do outro?

Medo todo mundo tem, de alguma coisa, de muitas coisas. É preciso acostumar-se com as novas situações, habituar-se ao jogo de roleta russa que a gente joga todo dia sem sequer dar conta. E não é fácil. A bala pode estar em qualquer câmara do tambor. Num revólver de seis balas, ninguém espera pela sétima. A vida é cheia de surpresas.

Aquele que teme a morte num jogo de roleta russa é aquele que deste deseja sair vencedor; é aquele que luta, pela vida.

É preciso coragem para lutar pela vida. Somente os que nada têm a perder, jogam roleta russa confiando no revólver.

*

O medo faz parte da vida da gente. Algumas pessoas não sabem como enfrentá-lo, outras - acho que estou entre elas - aprendem a conviver com ele e o encaram não como uma coisa negativa, mas como um sentimento de auto-preservação.

(Ayrton Senna)

Ayrton Senna nunca teve medo de arriscar, tornando-se um ídolo do povo brasileiro, cuja garra e coragem conquistaram milhões.

Conta-se que no dia de sua morte, Ayrton teria dito a sua namorada Adriane Galisteu que estava com medo daquela corrida.


"Tenho medo da morte e da dor, mas convivo bem com isso. O medo me fascina."

(Ayrton Senna)


*


Não existe corajoso que nunca tenha tido medo. Corajoso é aquele que conseguiu dominar seus temores, e vencê-los.

(Ana Cláudia Miranda de Carvalho)


(28 de janeiro de 2011, Débora Magno)



quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Malvado

Quem teve infância ou cresceu ao lado dos mais novos durante as décadas de 80 e 90, provavelmente se lembra de um desenho animado chamado ''Os Ursinhos Carinhosos''.

Eu sou de 1989, portanto admito ter passado minha infância assistindo desenhos como ''Cavalo de Fogo'', ''She-ra'' (vocês não imaginam a paciência que minha mãe teve durante meses, tentando me fazer desistir de pintar o cabelo de loiro, verdade vergonhosa, eu sei!), ''He-man'', e é claro, ''Os Ursinhos Carinhosos''.

Vou ser sincera com vocês e confessar que não me lembro de detalhes do desenho; a única coisa que me fez pesquisar e escrever sobre ele foi o Malvado. Lembram do Malvado?


Enquanto os Ursinhos disseminavam alegria, amizade, amor e outras virtudes, o Malvado, influenciado pelo sombrio Coração Gelado e sua sobrinha Laurinha, tinha como missão espalhar entre as crianças a tristeza e a maldade. Era uma criaturinha engraçada; seus planos diabólicos nunca davam certo, e mesmo quando a culpa não era sua, era ele quem levava a pior. Seu bordão: ''Tudo que é mau é bom.''

Acontece de interessante, que ele não era assim tão Malvado; como um Ursinho que não tinha dado certo, ele tinha algo de bons sentimentos. Seu jeito estabanado era quase infantil; tanto não tinha jeito para a crueldade que sempre punha a perder todas armadilhas que ele mesmo armava contra os Ursinhos.

Lembro vagamente de um episódio em que os Ursinhos salvam o Malvado de uma de suas próprias maldades, que para variar, havia dado errado.

O bichinho se enternece todo, mas no episódio seguinte, lá está ele armando de novo para sequestrar os Ursinhos Bebês.

É claro que, para a continuidade da série, era imprescindível que o coraçãozinho ainda meio bagunçado do Malvado seguisse bagunçado, e que ele tornasse a aprontar das suas. Era, afinal, o que conferia graça ao programa.

Mas esta essência humana do bichinho é que me intriga. O que diferenciava o Malvado do Sonho, da Doçura ou do Valente? Existem especulações a respeito: Malvado tinha medo do amor; ele nunca havia sido amado, não entendia a natureza daquele sentimento. Sempre fora destratado, considerado ''fraco e inútil'' por seu mestre; suas atitudes maléficas afastaram dele todas as outras companhias.

O Malvado até poderia ser um Ursinho Carinhoso, mas se comprazia na maldade, por desconhecer qualquer outro caminho.

Tinha também uma outra questão: por jamais ter conhecido o amor e os outros bons sentimentos, pensava que estes lhe eram dispensáveis, e que exigiam responsabilidades que ele julgava não possuir. Por esta razão, a criaturinha não contabilizava vantagens no bem que lhe era feito: a bondade era cheia de regras que acabariam pondo fim à toda a diversão. Ironicamente, Malvado não se divertia nada, enquanto os chatos e moralistas Ursinhos Carinhosos desciam no escorrega de arco-íris.

Para aquele que foi acostumado ao mau, o bem parece mesmo, pelo menos assim de início, algo meio complicado e ligeiramente monótono. Isso não significa, no entanto. que aquele que foi acostumado ao mau deve, via de regra seguir insensível. Notem que para o Malvado, a maldade custava muito mais saúde do que a bondade; e aquela história de ''tudo que é mau é bom'' ia pro saco rapidinho!

Também com alguns seres humanos a coisa funciona exatamente da mesma forma.

Estamos cercados por ''Malvados''; gente que se compraz no mau, embora nem tão maus sejam os seus sentimentos. Até nós mesmos podemos agir à maneira do vilãozinho, quando nos achamos insatisfeitos com a vida que vivemos. Quem nunca teve a desagradável sensação de que o bonzinho só toma, enquantos os maus estão aí, aparentemente felizes?

O cara cafajeste sai com todas as garotas bonitas, enquanto o bonzinho está sozinho.

A menina dita ''fácil'' tem enorme visibilidade na mídia, como na vida real, enquanto a boazinha passa despercebida, ou pior, passa por chata, frígida.

O seu colega de trabalho inescrupuloso consegue uma promoção, o bonzinho consegue apenas mais trabalho e um olhar indiferente do chefe.

''Tudo que é mau, é bom, né?''

Dá até vontade de ser mau também. De ser Malvado.
Só que vai lá, tenta: não vai dar certo.

Todos os seus planos de maldade vão se virar contra você, que acabará salvo pelo bonzinho e todo derretido. Ainda que volte a cometer suas malvadezas amadoras, você estará certo de que afinal, ''o bem não é assim tão mau.''

E de que aquela chatisse que você enxergava no bonzinho era na verdade coisa da sua cabeça. A maldade não é assim tão gloriosa quanto dizem.

Você acha que o bonzinho só se ferra? Experimente ser o Malvado, o pobre Malvado, fraco, inútil e carregado de culpas, mesmo aquelas que ele não tem. Experimente ser fadado a ser algo que você não é, durante uma vida inteira. Experimente o peso da frieza das outras pessoas que você acabará atraindo para si; todos os outros se afastarão.

Amor sem Fim, Carinho, Sonho, Ternura, Doçura... coisa de gente careta, de Ursinho Carinhoso, que não leva a nada?

Era o que pensava o Malvado também.
O pobre, fraco, inútil e culpado Malvado, que via na falta de sentimentos uma solução para seus problemas.

(Débora Magno)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

O Tempo (Envelhecer...)


''Viver significa ir em direção à morte. Nesse caminho topava-se com coisas que obstruíam a passagem. Essas coisas chamadas de 'problemas' tinham de ser consequentemente retiradas da frente. Viver significava então resolver problemas para poder morrer. ''


(Vilém Flusser, filósofo tcheco)

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O homem primitivo não conhecia o tempo; conhecia as marés, as fases da lua, as estações do ano.

Conhecia o nascer e o por-do-sol, sem contabilizar, no entanto, as unidades de tempo entremeadas a estes eventos espetaculares; os dias vinham e terminavam da mesma forma: seus afazeres dependiam da luz, e à chegada das trevas, seu tempo terminava. Seus anos chegavam e os deixavam sem queima de fogos, e suas as vidas nasciam e morriam sem aniversários.

Este homem envelhecia sem a consciência numérica do envelhecimento; sabia-se velho quando já não podia caçar ou arar a própria terra, quando já não produzia descendentes ou quando lhe falhavam as funções básicas. Enquanto não fosse vítima de nenhum destes revezes, pouca diferença lhe faziam os anos a mais ou a menos; seguia caçando, e se reproduzindo até que ''chegasse o seu tempo.''

Mas um dia...um dia este homem aprendeu a contar o tempo. Decidiu que seu dia precisava de horas e que durante cada uma dessas ele organizaria seu trabalho. Decidiu que sua vida precisava de anos, e que em cada ano ele focaria sua atenção em metas que desejava ver cumpridas. Decidiu que seus anos precisavam de propósitos e que a cada novo ano, amadurecia a fim de chegar à morte com bom aproveitamento.

Decidiu que as 13 anos era tempo de deixar as brincadeiras;
que aos 15 o trabalho era fundamental;
e que aos 18 era hora de servir ao país;
para aos 21 tornar-se um homem convicto.

Decidiu que aos 25 deveria ter completo juízo;
para aos 30 - no máximo!!- constituir família.
Aos 35 deveria já ter ao menos o ínicio de seu sucesso como genitor,
para aos 45, se eventualmente sua esposa já não procriasse, ter perpetuado seu sangue.
E então, aos 50, deveria iniciar-se sua preparação para a velhice
para que a hora imprevisível não o pegasse totalmente desprevenido.

E este homem caminhava então, lento e resoluto, em direção à morte.
Cada minuto que ganhava para si, era um minuto que perdia para a vida.

Como numa imensa ampulheta, a vida se esvaía continuamente até que o último grão, a exemplo de todos os demais, deixasse a vida em direção ao fim da contagem.

E tal como acontece ao prendermos nossa atenção a uma imensa ampulheta, cuja única função é esvair o tempo, este homem encontrou-se entediado. Triste, ressentido. Ora, se nós, os homens de hoje, não consideramos uma frustrante perda de tempo acompanhar aquilo que jamais alterará de curso?

Também aquele homem de quem o relógio fora um dia aliado, passou a achar que seu tempo se esvaía sem propósito; não conhecia nem um terço das províncias de seu país, não lia ainda nem o segundo volume de todo o conhecimento. Sabia de poucos indivíduos, de poucas histórias, de poucas soluções.

Tratava somente de seu tempo. De seus problemas, estes obstáculos ingratos em seu caminho a morte.
E porque caminhar em direção ao fim? O que o fim lhe reservaria, afinal? Ele não sabia.
Os anos a mais passaram a ser sinônimo de anos a menos; ou, diria melhor, de tempo a menos.

Menos tempo teria até que fosse chegada a maturidade;
menos tempo até que suas responsabilidades lhe roubassem a leveza de viver.
Menos tempo até que o casamento e os filhos representassem para ele ainda outras responsabilidades,
para as quais muitas vezes não sentia-se pronto.
Menos tempo até que a morte levasse suas oportunidades de ver tudo aquilo que ele desejava ver.

Se o homem moderno ainda teme a morte, saliento que não há final mais lento e doloroso, do que a vazão constante e contínua da própria vida.
Nenhuma doença nos paralisa mais, e nenhum acidente nos limita tanto, do que conformismo que muitas vezes nos arrebata frente a chegada e a partida dos anos.

O homem primitivo não fazia aniversário. Podia passar a vida sem saber com quantos anos havia andado, falado, ou amadurecido. Podia nunca aperceber-se de que havia uma idade certa para trabalhar, casar-se ou procriar. E no entanto, a natureza regrava seu comportamento para que quando fosse chegado o momento da morte, este homem tivesse cumprido aquilo que lhe era destinado cumprir. Que importava se este homem viesse a desposar uma mulher 10 anos mais nova? Também o amor fora traído pelo tempo!

Não sei como concluir este texto. Deixo em aberto para que cada um tire suas próprias conclusões.
Não sei ainda que peso tem envelhecer; só sei que nunca gostei de ver o tempo passar.

Quando já não conseguia me enxergar seguindo o ritmo da maioria das pessoas da minha idade, passei a procurar amigos e companheiros mais velhos; alguns metódicos seguidores do tempo certo já afirmam que estou atrasada em qualquer coisa.

''Mas já está na hora, hein!!" Mas será que está?
E se estivesse...? Tal como as marés ou as fases da lua, aquele momento não aconteceria simplesmente de forma...natural?

Pra mim, o melhor tempo é aquele onde não há pressa nem conformismo. Ainda que eu ainda seja um pouquinho ansiosa, sei que cada minuto que passa segue sendo um minuto a menos. E eu ainda quero admirar as paisagens ao longo do meu caminho...

(Débora Magno, 29 de setembro de 2010, às 01:47 a.m)



''Evite a impaciência. Você já viveu séculos incontáveis, e está diante de milênios sem fim.''

(André Luiz, ícone do movimento espírita)


Ao som de:

'' Claire de Lune'' - Claude Debussy (sou nova demais pra música clássica? rs)


Este foi quase...''sob encomenda'' rs...sigam acompanhando o blog!
beijos

domingo, 22 de agosto de 2010

Nuances


''O amor tem que ser
espertinho
algo assim entre a malícia do desejo
E a inocência do carinho...''

(Luiz Poeta)*

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Aos 2 aninhos, eu gostava de batucar as panelas da minha vó ao som de Give It Away, do Red Hot Chilli Peppers. Isso consumiu todo meu tempo livre até que eu caísse na armadilha de me apaixonar pela primeira vez: o nome dele era Bruno, e ele só tinha uns insignificantes 13 anos a mais; aquilo não deu muito certo, afinal.

Achei que jamais amaria novamente, mas aí fiz 3 anos, ganhei um cachorro e fiz umas amiguinhas, e ficou tudo numa boa. Até que uma destas novas amiguinhas começou a afanar minhas chupetas. Eu odiava ser passada pra trás, então comecei a fazer o mesmo com ela. No final de um ano, eu tinha uma coleção de 25 chupetas como prova de que ninguém me passava à perna. E continuamos tão amigas quanto antes.

Nesta época, como boa mulher bem resolvida, arranjei um namorado; ele gostava muito de caminhões. Só que às vezes eu me cansava um pouco de falar sobre caminhões, daí, arranjei outro namorado, pra pintar de gizão de cera comigo, já que desde muito criança eu tinha uma designer dentro de mim. Detalhe: eu continuei com o primeiro também. Naturalmente, depois de algum tempo, eu aprendi que isso não era muito recomendável.

Aos 6 anos, eu estava mais sossegada, começando a curtir uns lances mais artísticos mesmo; desiludida com a fase contemporânea dos Red Hot Chilli Peppers, eu descobri uma nova paixão musical. Minha música preferida; Santeria. Naturalmente, fui crescendo e esqueci a música, e a história de como ela retornou a minha vida é bastante interessante, tanto que fica pra uma próxima vez, que é pra eu poder contar direito.

Nesta fase mudei para um apartamento, doei meu cachorro e tive momentos de total crise existencial. Mas aí me deram um gato (engraçado como eu me curava facilmente de traumas criando animais...impressionante!!) e eu acabei me adaptando bem a nova situação.

Daí fui crescendo, tendo ao meu lado algumas das melhores pessoas que qualquer um desejaria ter por perto, e tendo a certeza de que estava muito bem assistida pela Pessoa mais importante que todos temos em nós.

Durante toda a minha infância e posteriormente adolescência, eu sempre fui assim; doce como uma paçoca. Meiga, mas de personalidade forte. Assim...agridoce, chocolate com pimenta. E descobri que minha personalidade não resiste a frase ‘’Eu Duvido’’; isso porque descobri minhas polaridades, os nuances que fazem de mim a pessoa que eu sou.


Nem sempre pude ser a pessoa que as outras pessoas esperavam que eu fosse; muitas vezes desejei ser igual, quando na verdade, eu era diferente. Mesmo hoje, adulta e segura de mim, já quis ser mais...normal. Foi quando descobri que o normal não faz história.

E esta é minha mensagem de hoje. Ir além da normalidade. Permitir-se pequenas bipolaridades que fazem de você um indivíduo singular. Fazer história com a sua própria história.

Permitir-se escutar reggae no escritório, molhar a batatinha no sorvete, cozinhar ouvindo Lady Gaga, jogar damas no msn com a prima enquanto discute aquele seu puta problema amoroso com a amiga na janela ao lado, assumir sua história e suas origens, rir de bobagens, tomar atitudes, ser modelo de amigas fotógrafas (e se orgulhar do resultado), beijar por que gosta; falar o que pensa, usar salto alto e gostar de pisar descalça na grama, ou se maquiar assistindo futebol.


Sim. Eu sou adepta de todas essas ''esquisitices''.


Como já dizia Raul: ''Eu prefiro ser esta metamorfose ambulante, do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo.''


Quem disse que bipolaridade tem que ser doença?

Quem disse que precisamos passar sempre no psicotécnico?


De perto, NINGUÉM é normal.


(Débora Magno)


*achei este poeminha bem adequado pro texto de hoje, porque não existe nada mais cheio de nuances do que os nossos sentimentos; quis postá-lo aqui também por me identificar bastante com ele.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Respeitável Público


Respeitável público!!!

Já dizia João Bosco:

‘’A esperança dança na corda bamba de sombrinha...’’

Frente a tanta vida e tanta acrobacia,
De menina aprendi a dançar na corda bamba,
De rosa, de ponta, como fosse bailarina...

Mas eu queria mais...

Inconseqüente, aprendi a emoção de um salto mortal!

Em fino liganete, assisti de cabeça pra baixo,
O show do malabarista...

Claves iluminadas brilhavam no fundo dos meus olhos,
Quando bambas, minhas pernas soltaram o liganete!

Eu estava caindo sem rede de proteção,
Mais uma clave descendo em direção ao malabarista...

Abri os olhos pintados de estrelas antes de tocar o picadeiro!

No entanto os demais malabares foram ao chão...

O circo pegou fogo!

Em meio à correria perderam-se figurinos, lantejoulas, paetês...
Mas, uma vez longe do fogo, os palhaços ainda riam.

Quanto a mim, aprendi com o malabarista a ter nas mãos
o controle da minha vida...

Em troca...

Ensinei-o a fechar os olhos... E saltar.

Afinal, somos mortais.


(Débora Magno – 21/06/2010)

Pink – Sober ♪

"Gostamos de correr riscos. É parte do que somos. Toda vez que entramos numa zona de conforto damos um jeito de sair. Sentir-se confortável num negócio como o nosso é muito, muito perigoso".
(Daniel Lamarre, presidente do Cirque du Soleil)

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Rosa Dourada*

*texto já publicado anteriormente no blog ''Loucura é Não Viver a Realidade'' em 20/04/2010.

Certa vez, há muito tempo atrás, realizou-se na Inglaterra um grande Congresso Científico, que reuniu as mais brilhantes mentes da época numa grande troca de experiências. Eram médicos, físicos, químicos, botânicos, biólogos, psicólogos e todos os tipos de inventores ou descobridores dos mais curiosos, aos mais céticos.

Corria pelo Congresso, a notícia de que um famoso botânico, vindo diretamente de Paris, estaria expondo a mais bela experiência científica já presenciada todos os sábios e por todos os tolos que assistiam aquele espetáculo racional da Ciência.

Eis que chega o velho botânico, com sua equipe de ajudantes, trazendo uma bela redoma de vidro na qual uma única rosa, dourada como ouro puro e brilhante como estrelas, resplandecia aos olhos daqueles que abriam caminho para o grande cientista, que caminhava reoluto em direção ao palco improvisado para a apresentação de sua experiência. Era perceptível o orgulho que o velho botânico sentia de si mesmo. Mas é claro, pensava ele, era merecido. Depois de anos tendo seu simples trabalho ignorado pelas correntes mais radicais da Ciência, ele finalmente provaria que merecia todo e qualquer crédito por ser o melhor, um mestre ousado de uma ciência totalmente nova.

Todos os cientistas e espectadores reuniram-se ao redor do palanque num silêncio estarrecido, seus olhos na bela rosa, enorme, repolhuda, dourada como guinéus**.

- Eis aqui minha experiência! - exclamou o velho botânico - Ousada, revolucionária...bela.

O cientista apontou com seus dedos para a parte mais inferior da grande redoma, onde um líquido púrpura parecia alimentar a rosa. Depois explicou, em sua linguagem científica, floreada e orgulhosa, que aquela rosa tinha sido drenada de toda sua seiva natural, e era alimentada pelo surpreendente líquido púrpura, que modificava instantaneamente a estrutura genética da planta.

E então, um jovem rapaz, ao fundo da pláteia, ergueu a mão num gesto de dúvida.

- Sim, meu rapaz? - atendeu o botânico.

- O que aconteceria se retirássemos a rosa da redoma?

- Ela morreria, talvez em questão de segundos. Mas enquanto no vidro, ela poderá durar a eternidade, se assim quisermos - respondeu o botânico, cheio de si.

- E quanto ao aroma, mantém se o mesmo? - tornou o jovem.

- Ahn... na verdade não. - respondeu o velho cientista, começando a perturbar-se com as perguntas impertinentes do jovem rapaz - a modificação genética faz com que a flor perca a essência original.

- Então, a flor não tem perfume? - perguntou o rapaz.

- Não...- respondeu o velho, ligeiramente encabulado - durante a experiência, o único odor que pudemos perceber foi algo parecido com álcool...os compostos utilizados para a confecção do...

O rapz interrompeu o velho cientista, causando revolta entre os mais velhos da comunidade. Mesmo assim, continuou:

- O senhor pensa que algum dia será possível ter uma criação de rosas assim?

O velho sentiu-se melhor com a pergunta:

- Sim, claro. Seria possível! É claro que necessitariamos de uma estufa bastante equipada para receber canais de irrigação e outras coisas, mas sim, seria bastante possível.

E então, sabiamente, o rapaz tornou:

- E para o que o senhor criaria rosas assim? Pelo que entendi, as condições de vida delas são bastante limitadas, uma rosa comum resistiria a mais impactos do que...

O cientista gaguejou:

- A longo prazo talvez, possamos...estender seu tempo de vida, ganhar para elas maior resistência...

O rapaz tornava-se o centro das atenções dentre a multidão:

- E o que mais elas perderiam em busca dessa resistência? Além do odor, quero dizer...

O cientista estava perplexo:

- Olhe, meu rapaz! Penso que sou eu o botânico nesta sala...

- Certamente é o que nos foi dito, senhor.

- E você? - perguntou o cientista com desdém - O que é?

- Sou poeta, senhor. E penso que se o senhor criou uma flor que jamais poderá ser ofertada a uma mulher, que jamais poderá perfumar um baile de bodas, e que somente sobreviverá única e eternamente de sua beleza artificial sem que jamais traga alegria àquele que não a puder possuir aprisionada, o senhor jamais criou uma flor. O que me leva a crer que o senhor não é mais um botânico.

E naquele momento, dentre o silêncio chocado de mais de quinhentas pessoas, o velho botânico, cuja metade dos anos foi gasta tentando achar aquele momento mágico em sua ciência que surpreendesse aqueles que faziam pouco dela, percebeu que tinha realmente esquecido o sentido de ser o que era. E que tinha esquecido o que era uma rosa.

Delicada, viva. Perfumada. De uma beleza natural que não necessitava ser modificada ou melhorada, pois que nenhuma era igual a outra, e nem deveria ser. Dentre uma estufa de rosas douradas e vazias, apenas uma simples e espontânea rosa vermelha traria alegria em um botão, essência a um convite, resistência a um inverno.

E no ano seguinte, após um delicado trabalho de reversão da experiência, o botânico apresentou uma simples rosa vermelha, saída da bela roseira que segundo ele fora plantada por ele mesmo em sua casa, a partir da rosa desintoxicada do experimento químico do ano anterior. Ofereceu a rosa vermelha a sua mulher, que na platéia de mais de mil pessoas, sorria emocionada.

(Débora Magno)
♪ Vanilla Twilight - Owl City ♪
♪ Claire de Lune - Debussy ♪


** Guinéus foi uma moeda de ouro Britânica.

Este texto realmente significa muito pra mim.